As oficinas de Produção Radiofônica na Sociedade de Assistência aos Cegos Instituto Hélio Góes, realizadas nas segundas-feiras entre os dias 28 de outubro e 18 de novembro, buscaram capacitar os alunos da instituição a produzir conteúdo comunicacional próprio através do veículo midiático mais familiar e acessível a eles: o rádio. O propósito do minicurso é promover a participação e a integração desses estudantes através do engajamento em uma atividade que reflita suas próprias demandas. Antes de visitarmos a instituição pesquisamos e fizemos um planejamento de como seriam as oficinas. Nesta etapa delegamos funções, cronograma e metas, além de criar um roteiro.
Ao todo foram quatro oficinas que ocorreram sempre às segundas-feiras no período da tarde (14h às 17h), nos dias 28/10, 04/11, 11/11 e 18/11. O número máximo de participantes das oficinas no início era de 15 estudantes com deficiência visual, regularmente matriculados e de frequência assídua das aulas e atividades propostas dentro do Instituto Hélio Góes. Mas muita gente se interessou e até o último dia recebemos mais alunos. No fim, eram 23 o total.
Parte da equipe – composta pelas estudantes de Jornalismo Andressa Souza, Bárbara Rocha, Camila Aguiar, Raíssa Veloso e Rosana Romão – visitou o Instituto Hélio Goes duas semanas antes do início das oficinas a fim de conhecer o espaço, as atividades realizadas e alguns dos alunos da organização. Assim, a partir de uma reunião com o professor Paulo Roberto, coordenador da Rádio Voz da Amizade, ficou acertado como as oficinas de produção radiofônica poderiam ser conduzidas da melhor forma para as pessoas com deficiência visual total e parcial.
No dia 28 de outubro de 2013, as oficinas foram iniciadas. Pessoas com deficiência visual entre 17 e 70 anos ocupavam a sala que seria o espaço para a discussão sobre o jornalismo radiofônico e para a produção de um programa de rádio feito a partir das ideias dos próprios alunos. Dentre os motivos para a inscrição nas oficinas, estavam interesses desde o aprimoramento da comunicação, aprender a locutar; diminuir a timidez; “falar corretamente”. Alguns até mesmo tinham o desejo de trabalhar em uma emissora de rádio.
Alunos revelaram suas relações com o rádio e o que esperavam das oficinas
Foto: Raíssa Veloso
Percebemos que o rádio é um veículo de comunicação fundamental para os alunos ali presentes. O programa Voz do Brasil (programa que está no ar há mais de 70 anos e veicula notícias relacionadas aos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, com duração de uma hora), por exemplo, comumente é motivo para desligar o rádio para as pessoas sem deficiência visual, afinal, podem ter acesso àquelas notícias de outra forma. No entanto, para os cegos da oficina de produção radiofônica, o programa estava entre os preferidos. O paulista José Raimundo espera a hora do programa para ligar o rádio.
Iniciamos a exposição de conteúdo apresentando algumas produções radiofônicas feitas pelas integrantes da equipe em disciplinas como Radiojornalismo I e Radiojornalismo II, realizadas no 4º e no 5º semestre, respectivamente. Ao refletirem sobre a programação das emissoras de rádio, os alunos inscritos na oficina começaram a discutir conosco sobre a ausência de uma diversidade nos programas que costumam escutar.
A rádio Voz da Amizade, que já era veiculada no Instituto Hélio Góes, também foi abordada durante a discussão, assim, os alunos expuseram o que já era contemplado na programação e o que gostariam que fosse abrangido. A partir disso, apresentaram sugestões para o programa piloto que iríamos ajudá-los a produzir nas duas últimas oficinas.
Ao trabalhar produção radiofônica com alunos com algum grau de deficiência visual é perceptível que a exploração dos sons traz riqueza de informações ao episódio que se quer mencionar. No segundo dia de oficinas no Instituto Hélio Goés, portanto, trabalhamos noções de radiojornalismo, gêneros e formatos radiofônicos, levando para discutir em sala exemplos sonoros do que estávamos apresentando. Ao falar sobre vinhetas e bg’s, por exemplo, fizemos um exercício de tentar identificar a que programa aqueles sons se relacionavam. Foi o caso das vinhetas dos programas Globo Esporte e Tela Quente, além da música-tema do piloto Ayrton Senna, afirmada pelos alunos como marcante.
Depois de perceber coletivamente a relevância dos sons para a identidade de produtos audiovisuais, os alunos da oficina radiofônica reconheceram a importância da escolha dos sons para o rádio. Em seguida, em outro exercício, identificamos as sensações que as trilhas sonoras e o tom de voz da locução passavam para os ouvintes. A aluna Nilda mencionou, inclusive, que para os cegos as emoções do locutor são muito mais perceptíveis, já que eles sentem através dos sons sensações implícitas à fala.
Por mais que tentássemos não deixar as explanações sobre gêneros e formatos radiofônicos cansativas, era nos exercícios que os alunos se envolviam com mais empolgação. Fizemos uma atividade de locução, no início da oficina, em que os alunos puderam pôr em prática as noções de lead jornalístico. Assim, além de ter a experiência – tão aguardada – com a locução para o rádio, os alunos da oficina puderam analisar as produções dos colegas e perceber como a construção para o rádio pode ser mais clara e direta.
A rádio do Instituto Hélio Góes não é comercial. Dessa forma, uma importante discussão realizada no segundo dia de oficina foi quais são os objetivos da programação do local. Provocamos os alunos no sentido de entender o que eles pensam para a rádio deles: informar sobre acontecimentos relacionados aos deficientes visuais; garantir a participação dos alunos nas atividades; compartilhar músicas do gosto dos alunos; estabelecer comunicação entre os setores do Instituto. Assim, suscitou-se o debate sobre a utilização da Rádio Voz da Amizade e o cuidado para que ele não se torne uma mera repetição do que já é feito nas rádios comerciais existentes.
No terceiro dia de oficinas, a programação previa que iniciássemos as práticas em rádio com os presentes. Na primeira parte da aula, sugerimos um programa de variedades sob a temática “O dia a dia dos cegos em Fortaleza”, visto que um dos objetivos iniciais dessa série de oficinas era capacitar os estudantes do Instituto a midiatizar suas demandas, colocando-se em pauta.
Com duração média de quinze minutos, o programa final será composto de produtos dos diferentes formatos radiofônicos apresentados nas semanas anteriores. Teremos um bloco composto por um boletim informativo de três notícias intercalado com três comentários opinativos; um radiodrama protagonizado e idealizado pelos próprios estudantes; além de programação musical escolhida por eles mesmos. Cada um desses blocos terá uma monitora para orientar sua produção. O nome do programa foi escolhido a partir de uma votação entre os estudantes a partir de sugestões que eles mesmos deram. “Eu, Você e a Informação” foi o vencedor.
Discussão sobre os personagens do radiodrama
Foto: Raíssa Veloso
Depois de uma tarde de planejamento e elaboração das partes do programa radiofônico que seria produzido pelos alunos do Instituto Hélio Goes, no terceiro dia de oficinas, o último encontro foi reservado para a gravação e edição final de todo o programa. Com as equipes definidas e os conteúdos prontos, cada uma das monitoras se reuniu com as equipes pelas quais estavam responsáveis para verificar e recapitular o que havia ficado combinado na penúltima oficina e para fechar aquilo que seria gravado durante a tarde. Finalizados os trabalhos de gravação, foi hora de começar a editar o programa, para que os alunos do Instituto pudessem verificar o produto final dos quatro dias de oficinas realizados no mês de novembro.
Raíssa Veloso grava a locução de uma das matérias do boletim de notícias com a aluna Carla
Foto: Andressa Souza
Pelo tempo corrido, não foi possível finalizar a edição do programa inteiro, visto que seria necessário mais tempo para a inserção de detalhes como BG’s, vinhetas e para o refinamento das locuções. No entanto, conseguimos editar um pedaço do programa, até o momento da entrada da primeira matéria do boletim de notícias. Era importante que os alunos pudessem ouvir o resultado do programa produzido, para que pudéssemos ter um feedback sobre o nosso trabalho.
Depois de escutarmos o programa, reservamos um momento com os alunos do Instituto para refletir sobre a função das nossas oficinas e sobre o aprendizado que eles tiveram. Muitos deles pediram que voltássemos outras vezes para continuar o trabalho. Outros disseram que pretendem continuar as atividades de rádio em outros projetos que possuem dentro ou fora do Instituto.