Archive | Julho 2016

Estudantes de escola ocupada em Fortaleza recebem oficinas sobre Comunicação

Equipe: Carolina Melo, Claryce Oliveira, Filipe Pereira, Nícolas Paulino e Theyse Viana.

A Escola de Ensino Médio Governador Adauto Bezerra, localizada no Bairro de Fátima, em Fortaleza, foi a quinta instituição ocupada por estudantes da rede estadual de ensino na Capital, durante a greve de professores. A ocupação no Adauto teve início na noite de uma quarta-feira, 04 de maio de 2016, como forma de reivindicar maior verba para merenda escolar, passe livre no transporte público e reformas estruturais e de ensino nas escolas, além de se alinhar à greve dos docentes da rede estadual.

Nesse contexto, os estudantes Carol Melo, Claryce Oliveira, Filipe Pereira, Nícolas Paulino e Theyse Viana, todos do sexto semestre do Curso de Jornalismo da Universidade Federal do Ceará (UFC), decidiram visitar a escola, conversar com alguns estudantes e oferecer a aplicação de oficinas sobre produções jornalísticas no ambiente da comunicação independente. A atividade integra a disciplina de Jornalismo no 3º setor, ministrada pela professora convidada Márcia Vidal. O objetivo é solucionar ou minimizar deficiências nos setores de comunicação de empresas ou instituições.

Em vez de procurar essas instâncias, a equipe decidiu ministrar os conteúdos para estudantes da ocupação na escola Adauto Bezerra, observando que esse público possui uma grande necessidade de produzir e expor conteúdos autorais, independentes e fiéis aos objetivos do movimento, aspectos que, muitas vezes, de acordo com eles, são deturpados pelos veículos da mídia tradicional.

Necessidades no âmbito comunicacional

Ao propormos as oficinais aos estudantes, descobrimos que eles utilizavam apenas página no Facebook  para comunicação externa, tanto com os apoiadores da ocupação quanto com outras escolas ocupadas. Adaptação do texto produzido pelos estudantes para linguagem web, criação de uma blog para organizar conteúdos, e uma melhor organização da comunicação interna entre os membros da ocupação foram listadas como as principais deficiências

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Dadas essas demandas, planejamos oficinas que pudessem agregar noções práticas de produção, redação e edição de conteúdos para serem veiculados na página, de forma completa, rápida e eficaz, como pedem as condições de consumo do suporte em questão.

Primeiro dia: oficina de leitura crítica da mídia

Sem títuloNo momento inicial do primeiro dia de oficinas, promovemos uma roda de conversa para conhecer nossos participantes, como forma de manter uma interação com o grupo. Pedimos que os estudantes relatassem que tipo de produtos midiáticos e noticiosos preferiam assistir, onde costumavam buscar informações e como eles avaliavam o posicionamento de empresas de comunicação tradicionais. Constatou-se, nesse debate, que a maioria deles deixou de verificar informações em jornais impressos e em programas de televisão por considerarem a abordagem dos assuntos parcial e “manipulada”. Além disso, todos acessam conteúdos jornalísticos na internet, principalmente no Facebook, embora alguns relataram ouvir rádio e podcasts com frequência.

Depois desta rodada, passamos a discutir coberturas realizadas por veículos locais sobre a ocupação no Adauto Bezerra. Mostramos notícias e reportagens hospedadas nos sites dos jornais O Povo e Diário do Nordeste, na rádio Verdes Mares 810 AM, no portal da Agência Brasil e nos telejornais CETV 1ª edição e Bom Dia Brasil e pedimos para que eles votassem se “leriam” ou “não leriam” os conteúdos. Na maioria dos casos, eles relataram a segunda opção pela abordagem de que os estudantes estão em greve como apoio aos professores, ou que a ocupação deixa milhares de outros sem aula. Outra forma de repúdio foi à referência de vandalismo dentro das escolas.

A conversa demorou mais de uma hora até que pudemos começar o conteúdo específico da oficina. Abordamos toda a rotina de produção jornalística, passando do recebimento da pauta até a edição final.

A equipe levantou questões sobre como as notícias que foram utilizadas como exemplo seriam recebidas pelo público desses veículos. Para isso foram analisados todos os componentes das mesmas, partindo do título, seguindo pelo subtítulo, as fotos escolhidas para compor as matérias e o próprio conteúdo em si. Os participantes da oficina contribuíram durante todo o processo de avaliação dos produtos da mídia.

DSC_0066.JPGOs alunos que ministraram a atividade também puderam relatar como são suas rotinas de trabalho, já que lidam com o fazer jornalístico em diferentes meios de comunicação (rádio, jornal impresso e web).

Conceitos como agenda-setting e os critérios de noticiabilidade foram explicados e inseridos dentro da perspectiva da ocupação, a partir do modo como a mídia tem tratado o assunto e as consequências diretas dessa abordagem mais geral e superficial que esses meios assumem. Discutiu-se também sobre o mito da objetividade jornalística e os diferentes aspectos que contribuem para a sua inexistência dentro do campo do jornalismo. E por fim, os termos e etapas presentes na produção jornalística como a pauta, a decupagem, o tempo e apuração dos dados foram esclarecidos.

O principal intuito da oficina foi mostrar os bastidores do processo de elaboração de uma notícia, demonstrando que ele está atravessado por múltiplos fatores, como ideologia do jornalista e da empresa, disfunções no processo de apuração, interpretação e tradução dos dados e condições trabalhistas, físicas e emocionais dos profissionais envolvidos. Além disso, tentamos contribuir para que eles, já críticos, pudessem aprimorar o olhar quanto a perceber as estratégias utilizadas para se montar uma ideia e os possíveis efeitos de realidade causados na audiência.

Segundo dia: oficinas de audiovisual, edição e texto para a web

Considerando que as produções em audiovisual são formas cada vez mais comuns e eficazes de comunicar, principalmente no contexto dos estudantes da ocupação, ministramos oficinas voltadas à produção de vídeos com foco em mídias móveis e à percepção do processo de edição com um viés mais crítico, abordando a construção de narrativas.

Num primeiro momento, mostramos elementos teóricos e práticos relacionados à fotografia e a vídeos: enquadramentos, planos, sequenciamento, efeitos de realidade, iluminação e técnicas para obter uma gravação visualmente eficaz. Foram explorados os efeitos de narrativa criados através da mudança entre planos fotográficos, variando entre enquadramentos mais abertos e fechados, possibilitando, assim, uma possibilidade  de escolha visual nas coberturas audiovisuais da ocupação.

Na parte de iluminação, o objetivo foi mostrar o potencial da luz em uma produção audiovisual; o quanto ela pode ajudar e atrapalhar, dependendo de conhecimentos prévios.  foram exemplificados casos em que a luz foi utilizada de forma a ser mais bem aproveitada além dos casos de contraluz e luzes “estouradas” (excesso de iluminação). Equilibrar o ISO (sensor de iluminação) da câmera e orientar a direção da luz no rosto do personagem e do cenário, sempre aproveitando a melhor luz possível, principalmente à noite, foram algumas das técnicas a serem ensinadas.  

Depois disso, focamos na captação de áudio, com dicas para aproveitar melhor os ambientes e evitar ruídos de comunicação e transtornos no momento de editar o material. Foram mostrados dispositivos que ajudam na identificação dos planos e tomadas e na sincronização entre imagem e som, como a claquete.

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Ao longo das explicações, mostramos vídeos com reportagens da mídia alternativa e também fotografias de profissionais reconhecidos, como Sebastião Salgado, a fim de exemplificar o que estava sendo dito e tornar o momento mais dinâmico e proveitoso. Os estudantes participaram ativamente, lançando questionamentos e relacionando os conteúdos da oficina a exemplos já vistos.

Quanto à oficina de edição, tivemos uma mudança de planos. A ideia inicial era mostrar ferramentas básicas para montagem e edição de vídeos no programa Sony Vegas Pro, muito utilizado para essa finalidade. Contudo, durante a sondagem, observamos que alguns estudantes que gerem as redes sociais da ocupação já tinham conhecimento técnico no tema. Decidimos, então, falar da edição como recurso para construção de narrativas.

Na segunda oficina do dia, o estudantes puderam ter uma base superficial, que era a permitida pela ocasião, sobre as principais características do jornalismo voltado para web. Ferramentas como o hiperlink, a personalização de conteúdo, a memória infinita, a instantaneidade/atualização continua e a interatividade foram introduzidos ao grupo.

Todos os tópicos foram contextualizados dentro de exemplos existentes dentro do jornalismo, como a apresentação do trabalho de conclusão de curso da jornalista formada pelo curso de Comunicação da UFC, Luiza Carolina Santo. O pacote multimídia intitulado de “Marcado na Pele” foi usado como exemplo de produto para web muitas vezes. Em diversos momentos da oficina as vantagens do jornalismo online sobre o tradicional foi explicitado, além do fornecimentos de dicas para os alunos de como administrar redes pertencentes ao movimento da ocupação.

Foi apresentado a ideia de criação de um blog para a ocupação, no qual os alunos usariam como uma plataforma de divulgação e arquivamento de informações e conteúdos referentes ao movimento e ainda poderiam divulgar a rotina na escola. Sites próprios para esse tipo de produto foram apresentado, especificamente o Wix e o WordPress. Também foram ressaltadas as características e positivas de cada uma das plataformas.   

A estrutura do lead jornalístico, público alvo e o conceito de pirâmide invertida também foram apresentados aos estudantes. Para finalizar, a equipe orientou e aconselhou possíveis formas de os próprios ocupantes promoverem uma comunicação institucional, de assessoria, do movimento com intuito de angariar apoio popular e atingir o espectadores desejados.